O Indie Lisboa vai-se sedimentando como o mais importante festival de cinema realizado em Lisboa, espaço único para o visionamento de obras menos acessíveis e para o acompanhamento das novas tendências ao nível do cinema independente. Bem organizado e dotado de uma estrutura cada vez mais sólida, proporciona ao espectador um sem número de escolhas. As minhas, este ano, foram as seguintes:
Não vi filmes portugueses, o que me deixou alguma pena, como também não tive a sorte de ver nenhum filme premiado, mas o tempo não pode dar para tudo e às vezes as escolhas têm que se fazer consoante os horários disponíveis.
Começando por "Breathless", é um filme de autor, no qual a violência e os recalcamentos que a mesma implica são abordados de uma forma pujante. Impressiona pelas imagens cruas e, a mim, causou-me uma intensa sensação de amor-ódio. Talvez não fosse o filme indicado para uma tarde amena, ou talvez a minha falta de gosto pelo cinema asiático influencie de forma determinante a forma como o avalio, pelo que, em relação a ele, não me estendo em comentários.
"Una Semana Solos" é um filme muito semelhante a outro que já vira há uns anos: "Temporada de Patos". Cinematicamente caracterizado por longos planos sequência em que se vão definindo personagens, conta a história de um grupo de crianças que ficam sozinhas num condomínio de luxo, durante a ausência dos pais. Entre brincadeiras e descobertas, vai-se abordando a transição da infância para a adolescência, entremeada pela questão da diferença de classes e do papel que, nessas fases, a mesma pode ter. Para mim peca por ter um argumento que, embora interessante, foi feito sem um rumo definido. Ainda assim, um olhar sobre o tão falado "novo cinema argentino", numa produção de Martin Scorsese.
Quanto ao último filme de Honoré, "La belle persone", diga-se que nem é tão mau como o anterior "Les chansons d'amour", nem está ao nível de "Dans Paris" ou "Ma Mère". Sendo certo que esta é e apenas poderá ser a minha opinião pessoal, acho-o próximo de "Dans Paris", tanto no que toca ao argumento, como relativamente à estrutura adoptada, embora, a meu ver, nada lhe acrescente. Em Honoré são interessantes as partes musicais (desde que não abusadas como aconteceu em "Les chansons d'amour") e neste filme podemos assistir a uma cena semelhante ao Avaint la haine de Dans Paris. É muito interessante a personagem interpretada por Léa Seydoux, uma actriz que brevemente se estreará nos ecrãs dirigida por Tarantino ou Ridley Scott. Foi o filme do qual mais gostei neste Indie 09 e penso que, não sendo uma obra prima, vale muito a pena.
"Il Divo" é uma espécie de biografia de Giulio Andreotti, antigo primeiro ministro italiano. Com um humor subtil e mordaz, dotado de uma brilhante montagem rápida e de visíveis cuidados de pós-produção, é um filme que põe a nú os evidentes problemas do sistema político italiano, focando especialmente as relações entre o mesmo e a máfia. No seguimento de Gomorra, mais um filme polémico que em muito mancha a história italiana. Muito bem realizado, recomenda-se a quem tenha interesse pelo tema e não só.
"Kinogamma" foi um filme que fui ver, só e apenas, porque durante os primeiros dias do festival
esteve no primeiro lugar da votação do público. Acabou por não se manter nessa posição, o que, a acontecer, seria para mim um desastre. Cinema não narrativo, com algumas imagens belas, mas enfadonho por si só. Imaginem o que seria ver 146 minutos de filmagens sem um único diálogo? Por sorte, houve intervalo a meio, razão pela qual apenas assisti à primeira parte do filme. Talvez tenha acontecido um milagre, ou talvez não, muito embora, com toda a franqueza, não possa crer que tal tenha ocorrido... Mais uma vez, opinião muito pessoal, até porque por estes lados, não se apreciam por aí além experiências cinemáticas puras, isto é, desacompanhadas de uma história...
Sobre "Fitzcarraldo", dizer em primeiro lugar que há dois tipos de filmes em Herzog, "os que têm
Kinski e os que não têm Kinski". Quanto aos primeiros, no qual se pode contar este "Fitzcarraldo", a sua aura torna-se sempre indissociável do filme, pela pujança que imprime às suas interpretações. Kinski é um louco, seja na tela ou fora dela, disso estou certo. Neste filme, encarna um louco "sui generis", que quer construir uma ópera na selva, disposto a, para isso, fazer um barco subir uma montanha! Na senda de "Aguirre", aquela que, para mim, é a obra prima de Herzog, mais um filme sobre a alienação e a cegueira que a mesma pode imprimir num indivíduo. Até onde vai a vontade quando a loucura não se esgota? Vejam o filme, certamente que nele encontrarão um esboço de resposta a esta pergunta.
"Nosferatu, the Vampyre" é uma versão muito pessoal da famosa história de Bram Stoker.
Muito longe da versão de Copolla e muito mais próxima da de Murnau, não apresenta porém a riqueza da estética expressionista desta segunda, embora o tente. Devo dizer que não gostei do filme por aí além... Há bons planos, uma boa interpretação de Kinski (totalmente transfigurado), mas peca pelo argumento. Com efeito, de tanto querer fazer uma coisa diferente, Herzog acabou por não acrescentar nada ao que Murnau tinha feito. Pelo contrário, criou uma história partida, em que a segunda metade do filme parece ter sido feita à pressa, descurando pormenores narrativos que, a meu ver, teriam enriquecido o filme. Não é um remake, mas se o fosse talvez tivesse sido um melhor filme...
"J'embrasse pas" é um filme cujo argumento foi escrito por Jaques Nolot e reaproveitado pelo
realizador dos brilhantes "Les roseaux sauvages", "Les égarés", "Les temps qui changent", entre outros. Sente-se no filme a cadência via de regra adstrita aos filmes de Téchiné, que é como quem diz, cinema francês típico, pausado quanto baste e capaz de, por planos, significar a alma das personagens. Como o próprio Nolot teve oportunidade de explicar antes do visionamento do filme, o seu argumento é autobiográfico. É a história de um jovem que chega à cidade e se apaixona por uma prostituta, a bela Emmanuelle Béart. É uma história em que um inocente perde a inocência para se tornar gigolô. Deixa algo a desejar o final do filme.
"Avant que j'oublie" é novamente um filme com aspectos biográficos de Nolot, cuja ideia principal se baseia na solidão da velhice e na leviandade com que o sexo é encarado, quase como forma de frivolamente estar, especialmente no que diz respeito aos homosexuais. Não me tocou por aí além, embora de um ponto de vista abstracto, consiga perceber o cerne do filme. O que fazer quando a nossa vida de jovens acabou e não conhecemos nenhuma outra? Uma experiência quiçá dolorosa para Nolot, ainda assim, um filme autoral, interessante para quem sinta o tema.
"Soul Power" é um documentário sobre música soul, sobre boxe, mas acima de tudo, sobre o movimento de libertação da raça negra. Em 1974 planeou-se um festival de música africana associado a um combate de boxe entre Muhammad Ali e George Foreman. Tal festival realizou-se no Zaire, embora não tenha sido possível realizar concominantemente o combate. Foram feitas filmagens na época, nas quais podemos ver concertos de James Brown, B.B. King ou Celia Cruz e "palestras" de Ali. O "Black Power" como base de parte da cultura ocidental contemporânea num documentário interessante montado em 2008 com fitas de 74. Vale a pena para qualquer amante da soul.
E assim se falou um pouco sobre o que se viu, não assisti a filmes que classifique de brilhantes, mas sabe sempre bem dar um pulo às salas...
falha nos nacionais .....
de resto bem dito ....